23ª Reunião Anual
24 a 28 de setembro de 2000
Caxambu, MG

volta para a página inicial da 23ªRA

 

CARTA DE CAXAMBU/2000

 Ao povo brasileiro e às autoridades constituídas:

Em resposta a todas as iniciativas que determinam, atualmente, o aviltamento e a deterioração da educação no país, considerando os princípios e compromissos que orientam historicamente sua prática, a Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educaçãoanpedo vem a público:

  • denunciar as graves circunstâncias que ameaçam a construção desse projeto coletivo e democrático de educação pública, gratuita e de qualidade;
  • reafirmar seu irrestrito compromisso com a instituição do direito à educação, como sentido e como prática;
  • rejeitar a submissão da política educacional às orientações de organismos financeiros internacionais;
  • conclamar a sociedade brasileira a compartilhar de suas preocupações e reivindicações.
A desmedida centralização na condução dos destinos da educação pública, o sistemático desprezo pelos pronunciamentos dos fóruns e instâncias de deliberação colegiada, bem como o recurso, cada vez mais freqüente, a procedimentos burocráticos impositivos estão entre as tendências de gestão governamental que ferem as disposições, os interesses e as mais firmes convicções do coletivo que a anpedo representa. Assim, a Associação conclama todos aqueles para quem a educação, mais do que um privilégio de poucos, constitui-se em direito de cada um, a denunciar o autoritarismo expresso:
  • pelas atuais políticas de avaliação centralizadas nos resultados em todos os níveis de ensino e sua utilização como instrumento do Estado de Regulação Social;
  • pelo descomprometimento com a educação infantil e de jovens e adultos;
  • pela ausência de políticas concretas para a educação de todos os grupos étnicos constituintes da nação brasileira, assim como dos portadores de necessidades especiais;
  • pelas políticas de exclusão relativas à educação no campo;
  • pelo desvirtuamento do sentido de autonomia universitária que obriga as IES a buscar fontes alternativas de recursos para garantir a concretização das finalidades de ensino, pesquisa, extensão e práticas culturais.
  • pela introdução de um novo modelo de pós-graduação stricto sensu que induz à descaracterização da formação à pesquisa, mediante a implantação de mestrados profissionalizantes - supostamente capazes de substituir, em alguns casos, o mestrado acadêmico;
  • pelo progressivo aligeiramento da formação de professores, em cursos que visam apenas à certificação formal daqueles que se deveriam qualificar para o exercício da profissão;
  • pela adoção de procedimentos que, fazendo uso indevido de instrumentos da democracia, previstos constitucionalmente, como as «audiências públicas», acabam por dissimular práticas que legitimam decisões unilaterais e restritivas;
  • na concentração de tecnologia em favor de poucos, em detrimento do amplo acesso da população.

Eis porque, reunidos em Caxambu, os associados da anpedo reafirmam suas históricas posições quanto à exigência de:

  • efetiva universalização da educação básica para crianças, jovens e adultos;
  • garantia de uma universidade pública, gratuita e de qualidade social;
  • condições dignas de trabalho, remuneração, carreira, formação inicial e continuada dos profissionais de todos os níveis e modalidades da educação;
  • recursos que possibilitem a garantia de atendimento público e de qualidade das necessidades educacionais em todos seus níveis e modalidades;
  • recursos compatíveis com a necessidade de garantir a regularidade, expansão e autonomia nacional da pesquisa e da formação de pesquisadores;
  • participação efetiva da sociedade nos processos de concepção, implementação e avaliação da educação pública brasileira;
  • processos de avaliação dos programas de pós-graduação que contemplem plenamente o exercício da liberdade acadêmica e científica;
  • apoio aos projetos educacionais dos movimentos sociais do campo;
  • implementação de mecanismos que divulguem e que incorporem as contribuições que o avanço da pesquisa educacional, em seus diversos campos, vem oferecendo à sociedade brasileira;
  • democratização do acesso e do uso criativo e crítico das novas tecnologias, bem como a implementação de políticas de ciência e tecnologia voltadas para o atendimento das necessidades da população brasileira.

Assim esperam os três mil pesquisadores e pesquisadoras, docentes e estudantes signatários dessa carta expressar sua contribuição ao movimento mais amplo que, delineado em todo o mundo e, em especial, na América Latina, realiza a criação de alternativas democráticas para os países desse continente.

Caxambu, 28 de setembro de 2000, no centenário de nascimento do educador Anísio Teixeira, defensor da democracia educacional brasileira.